O Urso do Pó Branco Review

Caso um dia você encontre um urso-negro no meio de uma floresta, saiba que é mais fácil ele não te atacar se você for pra cima dele. Ao menos é isso que a Wikipedia diz -- e que o Urso do Pó Branco repete após a hilária cena de abertura. E por mais que o filme se apresente como um bom pastelão nesses minutos iniciais, os pouco mais de 90 minutos que sobram conseguem montar uma história que vai muito além disso.

Sim, a história de um urso que cheirou a cocaína aconteceu. Porém, foi muito mais curta e trágica (spoiler da vida real: o urso morreu). Mas o filme de Elizabeth Banks toma as devidas liberdades para nos colocar numa década fantástica, com acontecimentos fantásticos e com mães fantásticas.

Começando pela escolha da música de abertura do filme, Jane, da banda Jefferson Starship. Embora a música tenha saído ainda em 79, ela é o tipo de som "oitentista" do imaginário popular -- e inclusive já foi utilizada com o mesmo intuito em Wet Hot American Summer, outra comédia cult maravilhosa da carreira de Banks, como atriz, no entanto.

Por ser um filme curto (e isso é algo muito positivo), o filme não enrola e logo após a abertura já nos mostra o poder do tal urso do pó branco ao mesmo tempo que nos situa geograficamente -- com a ajuda dos turistas vividos por Kristofer Hivju e Hannah Hoekstra. Depois, com o núcleo policial do filme (Isiah Whitlock Jr e Ayoola Smart), entendemos mais sobre o que acontecia na cena inicial -- e é quando o conflito derradeiro do filme é iniciado.

Então temos o primeiro contato maternal do filme, com Keri Russel e Brooklynn Prince como mãe e filha, respectivamente. Evocando as melhores aventuras infanto-juvenis dos anos 80, principalmente quando o personagem de Christian Convery (para delírio dos fãs de Sweet Tooth) é introduzido. A química dos dois amigos procurando confusão funciona muito bem na tela.

Como um bom filme de animal assassino (Tubarão é o melhor, certo?), não vemos o monstro inteiro em boa parte do filme -- o que pode ser um pouco decepcionante para uma parte do público, caro. Porém, os personagens humanos são fantásticos. Como a guarda florestal vivida por Margot Martindale (fazendo uma reunião completamente inusitada de The Americans).

O núcleo criminoso, que procura por toda a coca que caiu na floresta, é encabeçado por Ray Liotta (o último filme dele, já que o ator faleceu em maio de 2022), com a dupla Alden Ehrenreich e O'Shea Jackson Jr. -- que logo se torna um trio com a adição de Aaron Holliday. Novamente, a química do casting funciona muito bem e o trio tem algumas das melhores cenas do filme.

Mas o filme é do urso. Na verdade, Ursa. Como é constatado quase na metade do filme, o "cocaine bear" é fêmea. E é aqui que o filme tem a grande virada, já que é basicamente ao mesmo tempo em que Sari, personagem de Russell, começa a procurar a filha e encontra com Henry, personagem de Convery.

Há uma relação maternal de Sari com Henry, o melhor amigo da filha que deixa claro que não tem uma boa relação com o próprio pai. Inclusive, má relações com pais definem outros personagens do longa: Eddie (Ehrenreich) é filho de Syd (Liotta) e não só não fala com o pai como ainda deixa o próprio filho com o avô -- que não cansa de dizer que odeia cuidar do garoto. Há ainda a total ausência de um papai urso na família urso do filme.

Sim, há uma família urso no filme. E a relação dela com as duas outras famílias (a de Sari e a de Eddie) resulta no grande conflito do terceiro ato -- sempre com muito pó branco, mas dessa vez deixando claro que o filme é sobre mães e filhos e não sobre pais e filhos.