Marília Mendonça: com os pilotos mortos, alguém ainda pode ser ...
A Polícia Civil de Minas Gerais apresentou, nesta quarta-feira, a conclusão do inquérito do acidente aéreo que matou a cantora Marília Mendonça e outras quatro pessoas em novembro de 2021. Segundo as investigações, os responsáveis pela queda foram os pilotos Geraldo Martins de Medeiros e Tarciso Pessoa Viana, que teriam agido com negligência. No entanto, como os dois estão também entre os mortos, não podem serem réus em um processo na justiça, nem punidos. A polícia mineira sugeriu, com isso, que o caso seja arquivado.
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— Se os culpados estão mortos também, para a seara penal, o Ministério Público (MP) deve requerer o arquivamento — explica a professora Victoria Sulocki, da Faculdade de Direito da PUC-Rio — Mas se o MP entender que poderia ter outros culpados, ele pode requerer continuar a investigação.
Assim, caso o Ministério Público de Minas Gerais tenha um entedimento diferente em relação ao acidente, as investigações podem ser retomadas. Procurado pelo GLOBO, o órgão não se manifestou até o momento.
Para o advogado da família do piloto Geraldo Martins, Sergio Alonso, a responsabilidade da queda da aeronave recaí sobre a Companhia Elétrica de Minas Gerais (Cemig). Foi contra um cabo de alta tensão da empresa, não sinalizado, que aeronave colidiu.
— Entendendo que pode haver essa outra responsabilidade, o MP pode requerer mais diligências, como uma nova perícia — pontua Sulocki.
Ainda que o MP concorde com as conclusões do inquérito e opte pelo arquivamento, familiares dos mortos no acidente podem buscar compensações em um processo civil, fora da esfera penal. É o que faz a família de Geraldo Martins em um processo contra a Cemig. Para Alonso, pelo risco representado pela instalação dos cabos de alta tensão, a empresa tinha a obrigação de deixar evidente a presença dos obstáculos no caminho da pista do aeroporto.
— Ela plantou um risco sem sinalização. Mesmo que a torre esteja fora da zona de proteção, ela está por 800 metros. Não são nem 10 segundos para o avião passar. Por que ela não teve o bom senso de sinalizar? Ela correu o risco —disse o advogado ao GLOBO, em maio.
Na noite desta quarta-feira, horas após a apresentação do resultado do inquérito, a família de Marília Mendonça se manifestou em nota sobre as conclusões dos investigadores, com críticas e questionamentos ao que classificou como "argumentos rasos" e ausência de "provas técnicas". Para o advogado Robson Cunha, há "um direcionamento para imputar aos tripulantes a responsabilidade exclusiva para a causa do acidente".
"O que nos deixa com mais dúvidas do que com respostas, é o fato de ter sido apresentados argumentos 'rasos' da ocorrência. O delegado responsável não demonstrou esforços para apresentar provas periciais capazes de ultrapassar alegações comuns e midiáticas acerca do caso", afirma Robson Cunha, em nota.
O texto destaca ainda o que os representantes da família da cantora acreditam ser perguntas não respondidas pela investigação:
- Por que não foi respeitada a normativa internacional que obriga a sinalização nos cabos de energia existentes entre vales?
- Por que a localização do aeródromo nas coordenadas que são disponibilizadas aos pilotos pelos órgãos competentes estava errada?
- A quem competia a obrigação de fiscalizar a sinalização nos cabos de energia?
A nota critica ainda a demora na condução das investigações da Polícia Civil. Para os advogados, o órgão apenas esperava "a conclusão do laudo do CENIPA para entregar o relatório final", no qual faltariam "provas técnicas".
"Entretanto, essa demora apenas fez estender aos familiares uma angústia pela espera e a ineficiência do Estado de Minas Gerais em manter sob sua guarda o material do inquérito policial que era sigiloso, permitindo que um policial divulgasse na internet fotos do exame de necropsia da artista Marília Mendonça", diz a nota.
Robson Cunha afirma ainda ter solicitado ao delegado Ivan Sales, que presidiu o inquérito, o acesso a cópia integral dos autos, o que foi negado. "Portanto, ainda não temos ciência dos termos da conclusão", diz o advogado.