King Richard é indicado a seis Oscars: o que é verdade e ficção no filme

Will Smith brilha como em poucos momentos de sua carreira na condução de "King Richard: Criando Campeãs", filme que conta o começo trajetória das irmãs Venus e Serena Williams no tênis. Ao reproduzir os maneirismos do pai das meninas, que é de fato o fio condutor do roteiro, o ator coloca a película em um patamar acima da maioria. A prova disso foram as seis indicações ao Oscar anunciadas nesta terça-feira. King Richard está concorrendo a Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Atriz Coadjuvante, Edição, Roteiro Original e Canção Original.

E se Will Smith leva seu brilho próprio, é inegável que a história de Richard, Venus e Serena é um roteiro naturalmente feito para Hollywood. Um cidadão que nunca jogou tênis, mas viu uma partida na TV, descobriu que o prêmio em dinheiro era interessante e montou um plano de 78 páginas para fazer duas - não uma - atletas que se tornariam número 1 do mundo. Nem seria necessário "enfeitar" esse roteiro com dramas e cenas fakes.

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Mas o que é real e o que é ficção em King Richard? O dilema do fact-checking nesse caso é que, no que diz respeito à infância das irmãs, o roteiro é baseado em relatos do próprio Richard (no livro "Black and White: The Way I See It") e de Serena (no livro "On The Line"). Presumindo que tudo que já foi documentado aconteceu de verdade, a maioria do que acontece na película também se passou na "vida real". Vejamos:

Sim, Richard Williams bolou e botou no papel, em 78 páginas, um plano para fazer de suas filhas tenistas profissionais e campeãs. E sim, o livrão foi escrito antes do nascimento de Venus, a mais velha das duas. E sim, a ideia surgiu quando Richard viu na TV uma partida em que a romena Virginia Ruzici foi campeã de um torneio nos Estados Unidos em 1977. Ele descobriu o prêmio em dinheiro (US$ 40 mil) e viu no tênis uma oportunidade para suas futuras filhas. Venus nasceu em 1980, e Serena, no ano seguinte.

No filme, depois de brigar e levar a pior contra uma gangue de traficantes (essa parte realmente aconteceu), Richard pega a arma a que tem acesso em seu emprego como segurança e vai atrás do líder da gangue. O pai pensa em ir até o traficante e atirar, mas um carro surge na cena, e o traficante é baleado por alguém que estava no veículo.

Segundo o livro de Richard, ele, na verdade, começou a levar uma espingarda paras quadras, e isso fez a gangue parar de incomodá-lo. Em seu relato, ele conta que chegou a ir atrás de integrantes da gangue, mas não encontrou ninguém e desistiu. No caminho de volta para casa, viu um dos bandidos morto no chão, cercado por policiais e ambulâncias.

Isso é bem conhecido no mundo do tênis. Venus já estava em ascensão no circuito juvenil quando Richard tirou ela e sua irmã das competições. Vale lembrar que a ascensão das irmãs aconteceu justamente quando Jennifer Capriati, outro fenômeno adolescente, dava sinais de burnout. Jennifer chegou a ser presa por posse de maconha e, mais tarde, admitiu ter pensado até em suicídio.

Na época, todos os técnicos famosos acreditavam que afastar Venus e Serena dos torneios juvenis era loucura, e que Richard estava prejudicando de maneira irreparável a carreira das filhas. O tempo mostrou que não era bem assim...

O filme mostra a família morando no bairro de Compton, o que sugere que os Williams não podiam bancar condições de vida melhores. O roteiro, contudo, omite que eles moravam em Long Beach pouco antes e que Richard levou a família para Compton de propósito. Tudo fazia parte de seu plano.

"O que me levou a Compton foi minha crença de que os grandes campeões vieram do gueto. Eu estudei casos de sucesso no esporte como Muhammad Ali e grandes pensadores como Malcom X. Eu vi de onde eles saíram. Não havia lugar mais duro no mundo do que Compton. O gueto te faz forte, te faz cascudo. Por isso, eu fui para Compton com elas", disse o pai em uma entrevista à CNN.

Durante seu primeiro torneio profissional, Venus recebeu uma oferta de R$ 3 milhões da Nike. Contra a orientação do técnico Rick Macci, que fez o contato com a empresa, Richard rejeita o negócio. Macci acreditava que não haveria mais propostas como aquela, mas sete meses depois, Venus assinou com a Reebok por US$ 12 milhões.

King Richard não menciona o fato de que Isha Price, filha de um casamento anterior da mãe de Venus e Serena, também treinou para se tornar tenista profissional. Ela, no entanto, teve uma lesão nas costas e deixou o esporte para se tornar advogada. Isha esteve no set de filmagens boa parte do tempo e aparece creditada como produtora executiva de King Richard.

Assim como no filme, Richard conta em seu livro que um vizinho chamou a polícia, denunciando que Venus e Serena eram exigidas de maneira exagerada pelo pai. O caso não foi levado adiante pela polícia, como a película também mostra. E sim, Richard tinha métodos extremos para treinar as filhas. Macci contou ao jornal The Sun que o Richard de vez em quando colocava cacos de vidro no fundo da quadra, perto da grade. Era sua maneira de forçar Venus e Serena a evitarem recuar. Assim, ambas eram forçadas a jogar mais perto da linha de base, pegando a bola na subida e sendo mais agressivas.

Em um perfil da New Yorker, Williams também conta que arrancava as cabeças das bonecas de Venus para desencorajar o sentimento maternal. Ele também proibia ambas de namorarem.

Coisas que eu acho que acho:

- Não vi todos outros indicados, então não posso falar com propriedade sobre as chances de King Richard de levar o Oscar como Melhor Filme, mas posso falar mais uma vez sobre a atuação de Smith. O ator é espetacular ao copiar o jeito de andar e falar (inclusive com os erros de inglês), e sua atuação é crucial para o sucesso do filme.

- Som de hoje no meu Kuba Disco: Be Alive, de Beyoncé. A canção original que também está indicada do Oscar

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