Segundo dia de Enem é mais conteudista e traz assuntos inesperados
O segundo dia de provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2019 cobrou dos candidatos mais preparo e um conhecimento mais profundo sobre os temas abordados. Nessa segunda etapa os estudantes responderam a 45 questões de matemática e outras 45 de ciências da natureza (Química, Física e Biologia).
O UOL faz a correção online e o gabarito extraoficial em parceria com o Objetivo. O gabarito oficial será divulgado no dia 13 de novembro.
Assim como nos anos anteriores, a prova manteve a tradição de cobrar temas do cotidiano, que relacionam o conteúdo aprendido em sala de aula ao dia a dia dos candidatos. Chamaram atenção questões como o caso de uma cozinheira que salgou demais o caldo de feijão e usou as batatas para resolver o problema. A pergunta era sobre qual o tipo de processo que se dava e a resposta certa era osmose.
Em matemática, uma questão que citava o Tinder pedia que o aluno calculasse a probabilidade de match de acordo com a localização da pessoa.
A prova dividiu opiniões quanto às disciplinas mais difíceis, mas o consenso é que o exame foi mais conteudista do que anos anteriores. "Havia algumas questões em que o conteúdo cobrado era mais sofisticado e sem o domínio sólido desse conteúdo o candidato não conseguiria resolver", avalia o diretor do Anglo Vestibulares, Daniel Perry.
Em termos gerais, a prova de matemática foi mais trabalhosa, ainda que tivesse textos mais curtos, e exigia que o vestibulando dominasse bem os assuntos. Física apostou em mais contextualização, Química foi mais conceitual e Biologia teve tópicos que normalmente ficariam de fora.
Veja a seguir uma análise de professores e especialistas sobre o segundo dia de prova do Enem 2019.
BiologiaCaíram questões sobre ecologia, doenças, evolução e genética. "Não teve grandes surpresas em relação aos temas. Foi uma prova de grau médio de dificuldade", diz Davi Pereira, professor de Biologia do Sistema Poliedro.
Na opinião de Rubens Oda, professor de Biologia do cursinho Descomplica, a prova deste ano cobrou bastante conteúdo, seguindo a tendência dos últimos anos "Isso exigiu atenção e interpretação de conteúdo", avalia.
Caíram temas atuais, que eram apostas dos professores. Uma das questões pedia que o candidato indicasse uma opção de controle biológico de pragas na agricultura como alternativa aos agrotóxicos. Outra falava das vantagens do uso de vacina contra o agente causador da esquistossomose. Houve ainda uma pergunta sobre o motivo de usar batatas para tirar o sal quando o feijão está salgado.
Os textos foram bem contextualizados, mas houve quem sentisse falta de tabelas e gráficos. "Uma coisa que a gente sentiu falta foi uma questão com interpretação de gráficos. Todo ano cai e esse ano não teve", avalia Davi Pereira, do Sistema Poliedro.
Rubens Oda destaca uma questão de genética como uma das mais difíceis. "Ela foi cobrada com uma questão de linkage, que é uma exceção da Segunda Lei de Mendel. A questão perguntava em que situação a lei não é válida". Para ele, o tema é muito específico, o que exige o conhecimento do candidato, e não apenas a interpretação.
Oda também cita outro exemplo de questão que cobrou um conhecimento bem específico - uma pergunta sobre uma substância chamada BNP, que pode ser usada para emagrecimento. O candidato deveria responder como se dá esse processo nas células do corpo. "É um conteúdo específico porque o aluno tinha que saber o funcionamento da cadeia respiratória mitocondrial. Isso mostra que biologia não é só prova de interpretação", avalia o professor.
Constantino Carmelos, professor de Biologia do Colégio Objetivo, destaca uma questão sobre o crustáceo chamado artêmia que pode gerar polêmica. A pergunta era sobre o seu comportamento de locomoção em direção a uma fonte de luz. "A resposta correta teria que serfototactismo positivo. Mas essa opção não existe. Provavelmente vão dar como resposta correta o fototropismo. Aí eu acho que o Enem errou".
QuímicaO Enem manteve o padrão de cobrança dos últimos anos, com questões clássicas de eletroquímica, termoquímica e polímeros. No entanto, os professores acreditam que a prova teve um tom menos convencional.
A prova de química foi marcada por trazer diversos conteúdos sobre o cotidiano. "Foi um dos exames mais contextualizados que já vi e a maioria de questões era de química do cotidiano, que privilegiavam o conhecimento não-teórico", avalia o professor Pietro Camacho, do colégio Oficina do Estudante.
Para Juliana Rouvere, professora de Química do Sistema Poliedro, a prova foi bem elaborada. "Foi uma prova interdisciplinar e mais conteudista. Um tema recorrente foi a eletroquímica, que caiu em mais de uma questão", diz.
Havia questões que falavam do pH do solo e o que deveria ser feito para trata-lo. Outras questões abordaram como desentupir um ralo com soda cáustica ou tirar o cheiro de alho das mãos.
Para o professor Marcelo Pavani, coordenador do cursinho Oficina do Estudante, apesar da contextualização ser positiva, a prova foi mais cansativa do que a do ano passado. "As questões de química estavam pesadas", avalia.
Allan Rodrigues, professor de Química do Descomplica, destaca que poucas questões envolviam fórmulas - apenas duas. "Teve menos necessidade de fazer contas. Isso faz com que a prova seja mais rápida de ser resolvida".
Houve ainda algumas surpresas, como duas questões envolvendo modelos atômicos. "Essa questão me surpreendeu porque é um tópico do Enem que não costuma cair", avalia a professora de Química Márcia Aparecida Lopes, do Colégio Objetivo.
A professora comenta sobre as questões de meio-ambiente. "A gente esperava que fosse cair aquecimento global, chuva ácida ou efeito estufa, mas não caiu", diz. Em relação ao tema, o Enem cobrou uma questão sobre saneamento básico (como minimizar a carga de poluentes no sistema de esgoto) e outra sobre os benefícios de usar o concreto reciclado.
Para a professora, as questões de química orgânica e tipolometria foram as mais complicadas. "Na de química orgânica, as moléculas eram grandes e tinha que dizer qual era a propriedade que dava cor. Acho difícil o aluno acertar essa. Já em tipolometria, o aluno deveria fazer cálculos".
Outra surpresa é que nessa edição, não houve uma questão direta de estequiometria, a forma de calcular as quantidades de reagentes e produtos envolvidos em uma reação química.
FísicaDe acordo com Leo Gomes, professor de física do cursinho Descomplica, a prova deste ano foi a mais difícil dos últimos quatro anos. Segundo ele, os alunos que estudaram com base nas provas dos anos passados devem ter tido maior dificuldade do que os estudantes que já possuem um alto rendimento na área.
Gomes afirma que a prova teve uma mudança drástica no perfil e que os temas que caíram na prova de física não são tão recorrentes no exame. "Circuito elétrico e ondas são temas que sempre caem, mas que não tiveram tantas questões. Geralmente, a gente espera umas três", afirmou.
"Mecânica levou quase 70% da prova, com destaque de energia quando fala de energia mecânica e calor. Também teve o surgimento de questões que envolvem arcos trigonométricos. Apareceram duas questões de uma vez só", afirma.
Para o professor, as questões mais difíceis abordaram movimentos uniformes e energia. A questão mais fácil da prova foi a que tratava sobre coloração e uma pessoa daltônica. "Falava das cores e sobre a mistura delas. A única opção era a cor que não tinha vermelho", diz o professor.
Segundo o professor Ricardo Helou, do cursinho Objetivo, a prova foi original e pensou, sobretudo, no conteúdo programático que todo aluno deve saber. Ele deu ênfase nos conteúdos de termologia, ótica e ondas. "A prova obedeceu às mesmas prioridades dos anos anteriores", afirma.
O professor Mabson Molina, do Anglo, avalia que a prova foi comparável ao que foi pedido nos últimos anos, mas bem mais abrangente em termofísica, eletromagnetismo, mecânica, ótica e eletricidade. Para ele, a prova pode ser considerada de média para difícil. "As últimas edições do Enem tiveram uma complexidade e pede a habilidade conceitual e operacional. Não é só identificar o conceito, ele tem conseguir o resultado", explica.
De acordo com o professor Rodrigo Rossato, do cursinho Maximize, 80% das 12 questões de física já eram esperadas em relação ao conteúdo programático. "Você tem um conteúdo significativo, mas não teve nenhuma surpresa em termos de conteúdo, a não ser as interpretativas", afirmou.
Segundo o professor, algumas questões eram bastante trabalhosas e exigiam, muitas vezes, um nível de conhecimento que o estudante médio da rede pública não tem. "Ela estava mais rebuscada. Em uma escala de zero a 10, em que zero é muito fácil e 10 é muito difícil, a prova estava em um nível 7. Mas, o Estado hoje, no ensino brasileiro, consegue dar um nível 5", diz.
"Eu acho que a prova abordou algumas questões como, por exemplo, a de ondas, que envolvia um conceito que podemos dizer que não é regra. A prova exigiu que o aluno tivesse uma noção de construir a sua própria ideologia sobre a questão. Num contexto geral, estava em um nível muito acima do que se espera de um aluno estadual", comenta.
Porém, ele considerou que algumas questões já eram esperadas, como a de circuito elétrico. Além disso, ele deu um destaque para a questão que falava sobre geofísica. Segundo ele, esse tipo de questão, que aborda duas matérias, é uma tendência.
MatemáticaDe acordo com Rian Penachi, professor de matemática do cursinho Maximize, as questões da matéria que leciona estavam condizentes com as provas dos anos passados e as competências que são analisadas no Enem.
O professor classificou o nível de dificuldade da prova como média. Porém, ele acredita que a prova estava muito trabalhosa. "Eu gastei quatro horas, mais ou menos, para poder fazer a parte de matemática. Mas eu estava sem me preocupar, obviamente, com as questões de outras áreas", explica.
Penachi afirma também que o início da prova de matemática começava com as questões mais simples e que, depois, as questões iam alternando no nível de dificuldade. "Foram cobradas tanto a parte de álgebra quanto a de geometría. Isso estava bem equilibrado", avalia.
De acordo com o professor Carlos Seno, do Objetivo, a prova foi abrangente e tentou englobar o máximo possível de conteúdo. "As partes mais fáceis foram das questões mais diretas. Foi uma prova que tentou abranger questões de geometria, análise combinatória, porcentagem, matriz? teve também muita leitura de gráfico e de interpretação", afirma.
Para Robby Cardoso, do Anglo, o Enem pensou mais em exigir conteúdo e esperou que o aluno tivesse mais conhecimento técnico. Para ele, algumas contas eram muito trabalhosas e poderiam fazer o aluno perder muito tempo em apenas uma questão.