Subnotificação de denúncias é um dos obstáculos para combate ao trabalho infantil no Alto Tietê
Apenas Mogi das Cruzes divulgou dados recentemente sobre o trabalho infantil. — Foto: Reprodução/TV Mirante
A subnotificação de denúncias é um dos obstáculos enfrentados para a erradicação do trabalho infantil no Alto Tietê. Apenas quatro das dez cidades da região responderam ao questionamentos do g1 sobre esta questão. Neste domingo (12), é celebrado o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil.
Santa Isabel comunicou que não houve registro de trabalho infantil de 2019 até este momento. Mogi das Cruzes informou que os números são diretamente impactados pela questão da subnotificação e pela falta de denúncia, ainda muito presentes nesse contexto do trabalho infantil. Assim, qualquer número passado não reflete a realidade.
Já Suzano e Poá recomendaram que fossem apurados dados com o Conselho Tutelar do município e com o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente, respectivamente. Porém, não foi possível obter respostas de ambos os órgãos.
Para Bruna Ribeiro, jornalista especialista em Direito Internacional e gerente do projeto Criança Livre de Trabalho Infantil, a subnotificação prejudica o enfrentamento do trabalho infantil. E, infelizmente, este é um problema comum no Brasil.
“A gente sempre sabe que os números relacionados ao trabalho infantil são subnotificados. E isso tem relação com alguns fatores. Um deles é a denúncia, né? A palavra, por si só, denúncia muitas vezes leva as pessoas a acharem que quando você denuncia, você prejudica a criança ou você prejudica a família. Mas na verdade, quando você comunica as autoridades sobre uma situação de trabalho infantil, você está protegendo essa família”, explica.
Ela, que também é autora do livro Meninos Malabares – Retratos do Trabalho Infantil no Brasil, afirma ainda que denunciar situações de trabalho infantil é uma ação que protege as crianças e permite que este ciclo não seja reproduzido.
“Quando você comunica essa situação de trabalho infantil, você possibilita que rede de assistência social da prefeitura realize a abordagem dessa criança, realize visita a essa família e identifique se essa família está cadastrada no programa de transferência de renda. Possibilita uma conversa com esses pais para que haja conscientização, possibilita verificar se essa criança está matriculada na escola, se ela frequenta a escola, se ela frequenta atividades em contraturno escolar. Então, quando você comunica as autoridades, isso é super importante dizer para população, você está ajudando a criança”.
O Criança Livre é um projeto realizado pela Cidade Escola Aprendiz, uma ONG de São Paulo, com apoio institucional do Ministério Público do Trabalho e do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI).
De acordo com Bruna Ribeiro, a pobreza, a má qualidade da educação e questões culturais são algumas das causas do trabalho infantil.
“Segundo informações do Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador, o trabalho infantil é um fenômeno social presente em toda a história do Brasil. Entre os séculos XVI e XIX, crianças de origem indígena e africana também foram submetidas à escravidão, assim como suas famílias. O mesmo aconteceu com os filhos dos trabalhadores livres, que ingressaram cedo em atividades do campo e da cidade”, explicou.
A especialista em Direito Internacional também afirma que as consequências do trabalho infantil na vida de crianças e adolescentes são inúmeras.
“Além de muitas vezes reproduzir o ciclo de pobreza da família, o trabalho infantil prejudica a aprendizagem da criança, quando não a tira da escola e a torna vulnerável em diversos aspectos, incluindo a saúde, exposição à violência, assédio sexual, esforços físicos intensos, acidentes com máquinas e animais no meio rural, entre outros”, disse Bruna Ribeiro.
Na quinta-feira (10), a Fundação Abrinq divulgou o resultado do estudo “O Trabalho Infantil a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Trimestral”. Segundo a pesquisa, o trabalho infantil entre adolescentes de 14 a 17 anos aumentou em 33,4% durante a pandemia no Brasil.
Na comparação entre os últimos trimestres de 2020 e 2021, o número de jovens dessa faixa etária trabalhando em ocupações identificadas ao trabalho infantil aumentou em 317 mil, de acordo com o estudo.
Em março deste ano, a Prefeitura de Mogi publicou um estudo realizado pela Secretaria Municipal de Assistência Social que identificou mais de 100 crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil na cidade. O levantamento levou em consideração todo o ano de 2021 até o dia 10 de março deste ano.
A administração municipal afirmou, na publicação do estudo, que há um grande número de pessoas que não aceitam a abordagem e sequer fornecem dados, o que inviabiliza a identificação.
As prefeituras de Mogi das Cruzes e Suzano informaram que desenvolvem atualmente o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti).
Em Mogi, a iniciativa desenvolve ao longo de todo o ano ações para mapear e combater essa prática.
Além disso, Mogi também terá uma programação especial para celebrar o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil.
Já em Suzano, a ação envolve a capacitação de servidores e de entidades, oferta de oficinas para crianças e adolescentes, elaboração de diagnóstico para identificação de locais, tipos de trabalho e características das famílias e envolvidos nessa prática, e realização de campanha de conscientização da população para enfrentamento a esta situação.