Dia da Consciência Negra: O que Zumbi dos Palmares tem a ver com data

Grande nome da luta contra a escravidão de negros, líder do maior e mais conhecido quilombo da história, Zumbi dos Palmares tem cadeira cativa no hall dos guerreiros que lutaram pelo povo afrodescendente no Brasil.

Neste 20 de novembro, data em que se comemora o Dia da Consciência Negra e que marca os 327 anos sem o líder, Ecoa não poderia deixar de lembrar que, durante quase 20 anos, ele lutou contra investidas de portugueses e holandeses na defesa da sobrevivência de seu povo e pela sua liberdade.

Zumbi assumiu a liderança do Quilombo dos Palmares em 1678, posto em que permaneceu até ter seu esconderijo denunciado, em 1695, o que culminou em sua morte.

Mas quem foi Zumbi?

O historiador goiano Daniel Neves classificou Zumbi como um dos grandes personagens do Quilombo dos Palmares. No entanto, a história de vida dele é bastante imprecisa.

Neves explica que o guerreiro ficou conhecido por perder a vida pela sua causa. "Sabe-se pouco sobre vida dele. Muitas das histórias consideradas verdades até certo tempo estão sendo questionadas por alguns historiadores. Bem recentemente, acreditava-se que Zumbi havia sido sequestrado ainda criança e tinha sido criado por um padre. Esse padre o teria batizado com o nome de Francisco e o alfabetizado", explicou.

Nessa versão, Zumbi teria fugido do padre quando era adolescente e retornado a Palmares, onde assumiu posição de liderança. A história, no entanto, tem sido questionada por falta de evidências.

"Essa contestação acontece porque o autor do trabalho que sustenta essa versão da história utilizou cartas que somente ele teve acesso e que nunca disponibilizou para mais ninguém. Uma menção a Zumbi é feita pelo rei de Portugal D. Pedro II, em uma carta na qual o rei português propõe perdão para ele caso aceitasse viver como súdito de Portugal. Essa carta faz menção a uma esposa e a filhos de Zumbi e, apesar disso, os historiadores não sabem dizer se, de fato, ele teve esposa e filhos", diz o historiador.

Nome ou título?

De acordo com Daniel Neves, há entre os historiadores uma incerteza sobre o nome Zumbi. Enquanto uma parte acredita que se tratou do nome do guerreiro, outros avaliam que Zumbi pode ter sido uma denominação atribuída a quem assumisse a liderança do quilombo, assim como César, título que nomeava os imperadores romanos.

"Um indicativo disso é dado pelo historiador e pesquisador Felipe Aguiar Damasceno, que aponta que documentos holandeses da década de 1640 faziam menção a uma autoridade em Palmares que foi registrada por eles como 'Dambij'. A semelhança de 'Dambij' e 'Zumbi' sugere uma relação direta do personagem com uma posição de autoridade e da utilização do termo como um título", explica.

Zumbi e Palmares

A vida de Zumbi e o Quilombo dos Palmares são indissociáveis. A morte do guerreiro em defesa da luta contra todo o problema racial da época homogeneizou as duas histórias. O Quilombo dos Palmares surgiu no fim do século 16 e, segundo o historiador, foi batizado com esse nome por causa da quantidade de palmeiras que circundavam a área, atualmente conhecida como Serra da Barriga, em Alagoas.

"Palmares era uma junção de mocambos, que eram pequenas aldeias formadas por escravizados fugitivos. Por lá, havia algo em torno de 18 mocambos, que se espalharam por territórios que hoje correspondem a Alagoas e Pernambuco. O principal mocambo se chamava Cerca Real do Macaco, ou Mocambo do Macaco, e chegou a reunir até seis mil pessoas. O conjunto de mocambos que formou Palmares teve até 20 mil habitantes", conta.

Os conflitos contra holandeses e portugueses enfraqueceram o quilombo, que passou a sucumbir a partir da década de 1680. Novas expedições portuguesas foram organizadas, até que bandeirante Domingos Jorge Velho, contratado para destruir Palmares, conseguiu cumprir o prometido.

"Portugal prometeu a ele o direito de poder ficar com parte dos negros capturados e com algumas terras na região da Serra da Barriga. O Mocambo do Macaco acabou sendo destruído, em 1694, e os sobreviventes fugiram e resistiram até o começo do século XVIII."

"Esse protagonismo dele é importante, principalmente para que esse apagamento que aconteceu da história afro-brasileira seja combatido. Até para que consolide a concepção de que Zumbi, os africanos e descendentes de africanos escravizados não aceitaram passivamente a escravidão. Houve muita resistência e de muitas maneiras."

Daniel Neves, historiador

Denunciado e morto

Depois da destruição do Mocambo do Macaco, Zumbi e outros sobreviventes se esconderam na Serra Dois Irmãos. Passaram um ano e meio resistindo no meio do mato. Os registros, segundo Daniel Neves, relatam que Zumbi foi morto, em 20 de novembro de 1695.

Seus algozes o encontraram após um de seus companheiros, Antônio Soares, ser torturado e indicar o esconderijo. "Um bandeirante chamado André Furtado de Mendonça organizou uma emboscada que localizou Zumbi. Após ser morto, a cabeça dele foi decepada e exposta em Recife", diz Neves.

Legado antirracista

Acredita-se que, pela história de Zumbi, é possível entender que o legado dele é exatamente esse: o de alguém que se colocou à frente de um povo e decidiu lutar contra um sistema opressor, nesse caso, a escravidão, e contra o próprio racismo, que nada mais era do que o aniquilamento do povo negro do Brasil.

O historiador Daniel Neves destaca ser importante também considerar o papel de protagonismo que Zumbi assumiu nesse contexto porque ele entendeu que não havia possibilidade de coexistir pacificamente com um sistema que queria a destruição dele e de seus iguais. Segundo Neves, Zumbi entendia que a paz oferecida pelos portugueses era temporária e apenas uma distração para que, futuramente, o quilombo fosse destruído.

Dia da Consciência Negra

Hoje, dia da Consciência Negra, inclusive, tem a ver com esse líder. A ideia de celebrar esse dia no dia 20 de novembro surgiu pela primeira vez entre jovens negros de Porto Alegre.

O ano era 1971, e o Grupo Palmares se formava para estudar e pesquisar sobre a história do povo preto no Brasil. Sugeriram, então, uma troca: o dia 13 de maio, data da assinatura da Lei Áurea, considerada uma "falsa abolição" ou "abolição incompleta", deveria ser substituída pelo 20 de novembro — uma forma de valorizar o protagonismo de negros e negras na luta contra a escravidão e o racismo.

A escolha pelo dia não foi à toa: marca a data da morte de Zumbi dos Palmares. Apesar de não ser feriado nacional, em 2011, a presidenta Dilma Rousseff instituiu a data de 20 de novembro como o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.